São numerosas as razões para que o Pantanal receba nosso olhar atento e disposição a protegê-lo. Predadores incomuns, sorrateiros e perigosos sondam nossa terra com interesses obscuros.
Uma dessas silenciosas ameaças que acarretam danos irreparáveis é a biopirataria. Venho alertando há algumas semanas sobre os perigos de invasores nas terras pantaneiras. Esses perigos surgem travestidos das mais diversas maneiras, até mesmo, vêm com o discurso de proteção, tal qual a conhecida história do cavalo de Tróia: o povo pensa receber um presente, mas a terra é tomada por soldados no escuro da noite.
A biopirataria consiste na retirada ilegal de material genético, espécies de seres vivos e exploração do conhecimento do povo nativo de uma nação para a exploração comercial em outra, sem o devido pagamento de patente. O modo mais comum de caracterização dessa atividade ilegal é o envio não autorizado e não controlado de animais e plantas para o exterior.
Quanto às patentes, temos a Lei 9.279, de 14 de maio de 1996, conhecida também como Lei de Patentes, ela tem como escopo o caput de seu artigo 1º: esta Lei regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Esse dispositivo estabelece normas para resguardar e zelar pela propriedade daquilo que foi patenteado, entretanto, vem sendo driblado com artimanhas de pessoas de má índole que adentram locais como o Pantanal com o intuito de escamoteá-lo.
Por ser mundialmente conhecido pela rica biodiversidade, o Pantanal é alvo frequente de captura e venda ilegal de plantas e animais. Ainda, devido ao potencial genético, nosso bioma desperta interesse e atrai indústrias dos mais diversos ramos: alimentício, farmacêutico, têxtil…
A título de ilustração, o cupuaçu, fruto nativo amazônico, amplamente consumido pela população indígena local, possui registro de patente de uma empresa japonesa. Os impactos gerados pela detenção dos direitos sobre a fruta e seus derivados acarretam prejuízos incalculáveis quanto à exportação do fruto e a pesquisas relacionadas a ele.
O fenômeno já possui longa data, mas teve uma curva de crescimento vertiginosa nos últimos 40 anos, período em que, por exemplo, as indústrias farmacêuticas estão investindo em pesquisas e faturando bilhões de dólares por isso. Não se trata, é necessário frisar, de embargar as pesquisas e o desenvolvimento. Entretanto, é necessário proteger a fonte dessa riqueza e fazer justiça com o povo que vive nesses locais.
Esse processo descontrolado de retiradas da natureza a priva de renovar o que dela foi tomado. Não é possível saber com exatidão, todavia, estima-se que milhões de animais e plantas sejam contrabandeados de países como o Brasil, Indonésia, China e Índia.
O debate sobre o tema não é muito popular, mais um motivo para que falemos dele. A falta de consciência sobre os danos causados pela biopirataria abre espaço para uma exploração desmedida e injusta em terras como a nossa. As riquezas geradas aqui pertencem ao povo daqui.
Os piratas da biodiversidade, não raras vezes, parecem bem intencionados; buscam dialogar com nativos que tem conhecimento a respeito de cada planta e de cada animal e suas peçonhas, para, posteriormente, lançar mão desses recursos sem devolver nada a essa gente e prejudicando o desenvolvimento sustentável do local.
É comum que essa modalidade criminosa aparente uma “manta” de legalidade, que tem como objetivo camuflar a prática de atividades ilícitas e desvencilhá-la de qualquer suspeita, facilitando o tráfico de animais silvestres, recursos vegetais e minerais, e a biopirataria de modo geral.
É evidente a íntima ligação entre esse tipo de crime e o subdesenvolvimento das regiões em que ele acontece.
Estamos tratando de um dos maiores desafios contemporâneos. Preservar o meio ambiente é uma responsabilidade de todos, respeitar as pessoas, sua cultura e identidade também.
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