Éfato sabido e notório que o produtor rural lida com constante risco relacionado a sua atividade no que se refere às características climáticas, contudo, o que mais está assombrando esses heróis do campo é a insegurança jurídica que “persegue” a atividade. Esse é um problema que afeta a atividade econômica e a vida das pessoas que dependem da agropecuária para sobreviver, e de todos nós, já que somos inegociavelmente dependentes dessas produções. Daí advém o brocardo “se o produtor não planta, a cidade não janta”.
Nesse sentido, uma das principais causas dessa insegurança é a constante mudança nas leis e regulamentações que permeiam a atividade agropecuária a fim de atender a diferentes interesses políticos e, mais gravoso ainda, ideológicos, ignorando a realidade de quem trabalha e todos os transtornos que isso gera.
Quando as leis mudam com frequência, há revogaços, alterações mil, os produtores rurais têm dificuldade em planejar atividades de maneira eficaz, cumprir acordos ou até mesmo compreender se estão dentro da legalidade ou não. Parece que o jogo é feito para derrubar o produtor rural, algo inconcebível, ainda mais pela geração de emprego e renda do setor, importância da atividade no superavit da balança comercial brasileira e segurança alimentar dos brasileiros que está intimamente ligada a produção agropecuária.
Outras consequências abarcam, por exemplo, inúmeros conflitos entre os produtores rurais e as autoridades governamentais. Os produtores podem ser multados, processados ou até mesmo terem suas propriedades praticamente confiscadas se não estiverem em conformidade com as novas leis e regulamentações. Mas como fazer isso, se as regras parecem mudar a cada amanhecer?
A insegurança jurídica também afeta a imagem do Brasil como um país produtor de alimentos. Se os investidores e compradores internacionais percebem que as leis e regulamentações estão em constante mudança, podem ser desencorajados a investir no setor agropecuário brasileiro.
Assim, é fundamental que as autoridades governamentais trabalhem para fornecer um ambiente jurídico estável e previsível para os produtores rurais, algo que permita a esses heróis do campo planejar suas atividades de maneira eficaz e investir em suas operações com confiança.
Infortunadamente, não é isso que se vê acontecer no Brasil. O sentimento de insegurança jurídica é constante. Um exemplo que confirma bem essa insegurança jurídica é despacho subscrito pelo presidente substituto do Ibama, Jair Schmitt, assinado no dia 02/02/2023. O documento estremece muitas bases do exercício da atividade rural, mas, principalmente, põe em risco acordos oriundos de conciliações já finalizadas.
A motivação para tanto soa muito mais da ordem de arrecadação de dinheiro para a Administração Pública do que pela proteção do meio ambiente, tendo em vista que um dos argumentos citados no malfadado despacho é que “a manutenção dos acordos firmados pelos produtores rurais com a União, poderá fazer com que a União deixe de recolher cerca de R$ 3,6 bilhões em multas por infrações ambientais”. Com essa “canetada” foi revogado o Despacho nº 11996516/2022-GABIN.
O absurdo, com ares de perseguição, não cessa por aí, também está prevista a revisão de entendimentos de outros despachos; levantamento de dados; quantitativo de multas; bem como a criação de um grupo de trabalho destinado a revisar “outras decisões proferidas, no período de 2019 a 2022, pelas autoridades julgadoras definidas para atuar no âmbito do processo sancionador ambiental, tomadas em desconformidade com preceitos legais, orientações jurídicas e teses históricas que informavam o processo de apuração de infrações ambientais do Ibama”.
“Fica evidente que as mudanças são motivadas por ideologias políticas, perseguição, e jamais baseadas em evidências científicas”
Fica evidente que as mudanças são motivadas por ideologias políticas, perseguição, e jamais baseadas em evidências científicas. É preciso ponderar que mesmo políticas que foram bem-sucedidas em proteger o meio ambiente, garantir a segurança alimentar ou promover o desenvolvimento econômico estão sendo atacadas.
Eis uma profunda desconexão com o intuito da regularização ambiental e proteção do meio ambiente. Está se fazendo um desatar de acordos, aumentando o caos na área. Essa desmedida aplicação de multas, arbitrária e seletiva, e revogações não embasadas devidamente, pode ser vista como uma maneira “fácil” de demonstrar que a Administração Pública está cumprindo seu papel de proteger o meio ambiente, sem necessariamente ter que enfrentar desafios mais complexos, como a implementação de políticas públicas e programas de educação ambiental realmente eficientes. Isso pode levar a uma abordagem punitiva em relação à proteção ambiental, em vez de uma abordagem mais proativa e preventiva.
Não vamos nem adentrar ao mérito da importância da conciliação nos processos, um tema que frequentemente abordamos aqui, mas não podemos nos omitir de criticar o desmantelo dos acordos já realizados. Não se tem mais segurança jurídica!!!
Por fim, é uma obviedade que uma propriedade rural regular tende a incidir menos em crimes ambientais por diversos motivos, visto que está sujeita a um conjunto de normas e regulamentos que estabelecem regras claras para a utilização da terra e dos recursos naturais.
Além disso, uma propriedade rural regular geralmente conta com mais recursos e capacidade de gestão ambiental. Esses produtores têm mais acesso a informações e tecnologias para melhorar a gestão ambiental em suas propriedades, como técnicas de conservação de solos e água, manejo sustentável de recursos naturais e boas práticas agropecuárias. Isso reduz a pressão sobre os recursos naturais e evita a degradação ambiental.
Até mesmo o convívio e o envolvimento com a comunidade local e a sociedade civil organizada fica melhor quando a propriedade está de acordo com o previsto em lei. São relações mais abertas ao diálogo e à colaboração com a sociedade, o que contribui para o desenvolvimento de relações de confiança e ações conjuntas para a proteção do meio ambiente.
Assim, o meio ambiente equilibrado é interesse dos produtores rurais brasileiros, porque afeta diretamente a produtividade e a rentabilidade da atividade, a disponibilidade dos serviços ecossistêmicos, a demanda do mercado e é uma obrigação legal e moral. A proteção do meio ambiente é fundamental para a sustentabilidade do setor rural e para a promoção do bem-estar humano. Mas, parece que o Ibama ultimamente ignora todos esses preceitos e pretende apenas enriquecer os cofres públicos às custas de muitas injustiças e desmandos!!!
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