Medidas federais sobre as mudanças climáticas

Não é preciso ser especialista no assunto de aquecimento global para notar os efeitos das mudanças climáticas, especialmente nos últimos tempos. Esse tipo de tema movimenta a sociedade há muitos anos e os resultados das alterações acarretam preocupações sobre a vida como um todo.

Para lidar, ainda que parcialmente com a situação, na data de 19 de maio de 2022, foi publicado o Decreto Federal nº. 11.075/2022 que estabelece os procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas, institui o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SINARE) e altera o Decreto nº 11.003, de 21 de março de 2022.

Não se pode olvidar que as mudanças climáticas estão entre os principais desafios da humanidade, ainda mais quando se analisa os impactos que isso pode ter na saúde humana, aos ecossistemas e à biodiversidade, aos recursos hídricos e, sobretudo, ao campo econômico, principalmente para a atividade agrossilvipastoril, que é empresa a céu aberto, totalmente dependente do clima, do plantio à colheita.

Isso é evidente no dia a dia do homem do campo. Contexto em que, por exemplo, a semeadura é realizada na janela adequada (período baseado em características meteorológicas e de costume), contudo, se chove pouco, impacta na germinação e condução da safra; ou, se chove muito, atrapalha a colheita.

Na atividade pecuária não é diferente, até mesmo porque ou a engorda do gado é dependente da agricultura, nos confinamentos; ou é feita a pasto. Em ambos os casos o clima impacta de forma direta.

É preciso atentar-se para o fato de que, no que concerne à economia, o setor produtivo é um dos que provavelmente mais sofrerá com as variáveis climáticas. Os transtornos são supostos com base na ausência de medidas adaptativas. As consequências no campo resvalam nas mais diversas searas: produção de alimentos, geração de emprego e renda, entre tantas outras perdas.

O Decreto Federal nº. 11.075/2022, em um primeiro plano, veio em bora hora, razão pela qual o vemos com bons olhos, pois, institui que os Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas estabelecerão metas gradativas de redução de emissões antrópicas e remoções por sumidouros de gases de efeito estufa, mensuráveis e verificáveis, consideradas as especificidades dos agentes setoriais.

As medidas deverão se ajustar para diferentes agentes setoriais, levando-se em conta a categoria determinada de empresas e propriedades rurais, o faturamento, os níveis de emissão, as características do setor econômico e a região de localização.

Como exposto, o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões, trazido no Decreto Federal nº. 11.075/2022 constitui mecanismo de gestão ambiental e será instrumento de operacionalização dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas, pois, o objetivo é atuar como ferramenta de implementação dos compromissos de redução de emissões mediante a utilização e transação dos créditos certificados de redução de emissões. Seria uma espécie de banco de créditos de carbono.

Para se conseguir operacionalizar o que preconiza, o documento citado cria o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa – SINARE. Esse órgão possuirá como função principal avaliar os critérios para compatibilização, quando viável técnica e economicamente, de outros ativos representativos de redução ou remoção de gases de efeito estufa com os créditos de carbono reconhecidos, por proposição do órgão ou da entidade competente pelos referidos ativos.

Outro aparente acerto do Decreto Federal nº. 11.075/2022, é que ficará sob o encargo do SINARE, enquanto sistema de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa, a gestão da geração de créditos certificado de redução de emissões, uma vez que o Art. 8º dá um pontapé inicial para um mercado muito promissor ao produtor rural, que é a possibilidade de comercializar, transacionar os créditos provenientes do carbono captado em seu imóvel rural.

Assim, em ato conjunto dos ministros de Estado de Maio Ambiente e da Economia, virá uma regulamentação estabelecendo regras de: I – o registro, II – o padrão de certificação do SINARE, III – o credenciamento de certificadoras e centrais de custódia, IV – a implementação, a operacionalização e a gestão do SINARE, V – o registro público e acessível, em ambiente digital, dos projetos, iniciativas e programas de geração de crédito certificado de redução de emissões e compensação de emissões de gases de efeito estufa, e VI – os critérios para compatibilização, quando viável técnica e economicamente, de outros ativos representativos de redução ou remoção de gases de efeito estufa com os créditos de carbono reconhecidos pelo SINARE, por proposição do órgão ou da entidade competente pelos referidos ativos.

Para consecução do anteriormente exposto, o Art. 9º do Decreto Federal nº. 11.075/2022 elucida que são instrumentos do SINARE: I – o registro integrado de emissões, reduções e remoções de gases de efeito estufa e de atos de comércio, de transferências, de transações e de aposentadoria de crédito certificado de redução de emissões, II – os mecanismos de integração com o mercado regulado internacional, que devem ser estabelecidos em conformidade com as regras previstas no § 1º do art. 8º e, III – o registro do inventário de emissões e remoções de gases de efeito estufa.

“Com a criação do SINARE, acreditamos que será uma boa forma dos nossos heróis do campo serem recompensados pela proteção que eles dão, não só a flora, mas, sem dúvidas, a nossa fauna.”

Ana Lacerda

Sabe-se, há muito, o quanto o produtor rural é impactado em seu potencial de produção com a legislação ambiental que o obriga, em alguns casos, a manter uma área de 80% de seu imóvel como sendo de reserva legal, área na qual não se pode haver supressão, desmatamento da vegetação, contudo ninguém o paga por isso, ou seja, temos a aplicação do afamado brocardo “fazer cortesia com o chapéu alheio”.

Com o Decreto Federal nº 11.075/2022, mais ainda, com a criação do SINARE, acreditamos que será uma boa forma dos nossos heróis do campo serem recompensados pela proteção que eles dão, não só a flora, mas, sem dúvidas, a nossa fauna.

Assim, de forma a deixar as coisas de mais fácil entendimento, o Decreto Federal nº. 11.075/2022 trouxe alguns conceitos essenciais, tais como: crédito de carbono: ativo financeiro, ambiental, transferível e representativo de redução ou remoção de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente, que tenha sido reconhecido e emitido como crédito no mercado voluntário ou regulado. Já o “crédito certificado de redução de emissões” corresponde ao crédito de carbono que tenha sido registrado no SINARE.

Restou expresso também o que é crédito de metano: ativo financeiro, ambiental, transferível e representativo de redução ou remoção de uma tonelada de metano, que tenha sido reconhecido e emitido como crédito no mercado voluntário ou regulado.

Ainda, compensação de emissões de gases de efeito estufa: mecanismo pelo qual a pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, compensa emissões de gases de efeito estufa geradas em decorrência de suas atividades, por meio de suas próprias remoções contabilizadas em seu inventário de gases de efeito estufa ou mediante aquisição e efetiva aposentadoria de crédito certificado de redução de emissões.

E, por fim, também ficou estabelecido sobre unidade de estoque de carbono: ativo financeiro, ambiental, transferível e representativo da manutenção ou estocagem de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente, assim compreendidos todos os meios de depósito de carbono, exceto em gases de efeito estufa, presentes na atmosfera.

Havia uma lacuna regulamentar de quase treze anos quanto ao assunto e emerge contemporaneamente figurando como instrumento de defesa do direito coletivo a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, em atenção às futuras e presentes gerações. O ato é o passo inicial para a criação de um mercado doméstico de crédito de carbono, algo de suma importância para o fortalecimento das políticas públicas de preservação do meio ambiente, de reconhecimento, valorização de quem efetivamente preserva e, sem dúvidas, para a soberania nacional.

A criação desse mercado responde às diversas críticas que o Brasil recebe, configura um compromisso de redução de gases nocivos à atmosfera e o faz pioneiramente. É dever fundamental do Poder Público elaborar e por em prática ações como a proposta, visando à inclusão produtiva dos agricultores, à promoção da segurança alimentar e à sustentabilidade ambiental, zelando pelo alívio às perdas de safra, garantindo condições mínimas de sobrevivência aos seres humanos e animais, bem como viabilizando a segurança alimentar ao povo brasileiro.

Sem dúvidas veio em boa hora o Decreto Federal nº. 11.075/2022, agora é torcer para que sua operacionalização realmente consiga colocar em prática o seu intuito, ainda mais porque será uma excelente ferramenta de valorização do homem do campo, que fica com a incumbência, obrigação, de preservar o meio ambiente, contudo não tem contraprestação necessária para tanto.

Ana Lacerda é advogada do escritório Advocacia Lacerda e escreve exclusivamente nesta coluna às quartas-feiras. E-mail: analacerda@advocacialacerda.com. Site: www.advocacialacerda.com