No dia 18 de julho de 2022, o governo do Estado de Mato Grosso publicou o Decreto n.º 1436/2022, que dispõe sobre o processo administrativo estadual de apuração das infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, regulamenta o Programa de Conversão de Multas Ambientais e dá outras providências.
De forma inicial é importante parabenizar o Estado, por meio de seus representantes, pelos avanços observados no supracitado Decreto, principalmente quanto a deixar claro quem são os legitimados para apurar infrações ambientais, o que se deve conter, de forma expressa, no auto de infração, algo de suma importância para que o autuado saiba do que está sendo acusado e como se defender disso, bem como a criação da possibilidade de conciliação e a regulamentação do previsto no artigo 127 da Lei Complementar n.º 38 quanto ao Programa de Conversão de Multas Ambientais.
Dada a amplitude dos temas abarcados pelo documento em discussão, optamos por dividir os assuntos em duas partes. Esta, que tratará sobre a conciliação, e uma próxima que versará a respeito das possiblidades de desconto abertas com o Decreto (regulamentação do previsto no artigo 127 da Lei Complementar n. 38 quanto ao Programa de Conversão de Multas Ambientais).
Primeiramente insta sobrelevar que a normativa dispõe sobre o processo administrativo, e não judicial, ou seja, está diante da possibilidade de resolver demandas ainda não judicializadas. Nesse âmbito, cabe ao Estado agir com eficiência e legalidade, dando cumprimento ao previsto, a fim até mesmo de evitar a sobrecarga do já tão abarrotado estoque processual do judiciário.
Outro ponto que merece destaque é que os prazos previstos no Decreto n.º 1436/2022 serão contados em dias úteis, algo idêntico ao que se tem na norma processual civil, ou seja, os processos administrativos que tramitam na SEMA-MT terão trâmites, quanto a prazos, assemelhado ao verificado na Justiça, para processos civis, assim, são excluídos os feriados e finais de semana da contagem. Todavia, imperioso informar ao leitor que tal regra possui exceção, algo trazido de forma expressa no artigo 27, § 3º quanto “a leitura da correspondência eletrônica deverá ocorrer, com a respectiva confirmação, em até 10 (dias) dias corridos, contados da data do envio da intimação/notificação, sob pena de considerar-se efetivada automaticamente na data do término desse prazo.”.
Outro ponto de destaque, mais uma vez caminhando o Estado de Mato Grosso a se assemelhar ao disposto nos processos judiciais, é a extinção do papel, uma vez que, os processos de apuração e julgamento de infrações e correlatos tramitarão de forma eletrônica, por meio do Sistema Integrado de Gestão Ambiental de Autuação e Responsabilização – SIGA AUTUAÇÃO/RESPONSABILIZAÇÃO. E, nesse sentido, cabe ao interessado, representante legal ou procurador o cadastramento no portal. Dessa maneira é preciso estar atento ao processo eletrônico e fazer o cadastro da forma correta.
Uma das questões de maior interesse das quais disserta o novo regramento é sobre os procedimentos para apuração e julgamento de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. A preferência deve ser dada sempre para a conciliação, algo louvável e que deve ser sempre o ponto de partida, pois, ao se prezar pela conciliação, o intuito é buscar a pacificação, a reconciliação, o acordo, deixando de lado o famigerado intuito de tudo ser resolvido por meio de processo judicial e passando a criar uma outra cultura, a de buscar uma solução consensual ao problema.
Insta sopesar que ora elencado é algo muito importante, é uma mudança de cultura, a quebra de um paradigma, até mesmo porque sai a visão do produtor rural devastador do meio ambiente, do homem do campo que deve ser penalizado a ferro e fogo e passa a ser criado um ambiente mais ameno, agradável, que busca entender os dois lados a fim de se chegar a uma solução consensual do problema e, sem sombras de dúvidas, quem vai sair ganhando será o ambiente ecologicamente equilibrado, protegido e/ou regenerado.
É um avanço muito significante!!!
É preciso sublinhar que a conciliação deve ser realizada dentro do cumprimento da legalidade, assegurando a observância apenas das formalidades imprescindíveis, um corte de percursos burocráticos, despindo o processo de rituais desnecessários, dando mais eficácia ao desenrolar do processo.
No que diz respeito às questões ambientais, a celeridade é fundamental e a conciliação pode ser uma importante aliada nesse aspecto. Vale rememorar que o Decreto Federal nº 9760/19 alterou o Decreto Federal 6514/08. A partir daí, na esfera administrativa (âmbito federal) foi incluída a possibilidade de conciliação, algo agora previsto no âmbito estadual. Vislumbramos uma nova era no Estado de Mato Grosso, algo que deve sim ser comemorado, pois, o que se visualiza é ter o ambiente agora mais protegido e, sendo verificado algum equívoco quanto a isso, est-9 exposto as regras, o modus operandi que deve ser realizado para que se conseguir tal objetivo.
Sobre o tema, importante igualmente mencionar a instrução normativa conjunta 1, de 12/04/2021, do Ministério de Meio Ambiente, do IBAMA e do ICMBio. Editada para regulamentar os processos administrativos de apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente no âmbito federal, que, por sua vez, dispõe no artigo 42 sobre a possibilidade de realização de audiência de conciliação após a lavratura de auto de infração e os procedimentos para sua ocorrência.
Outrossim, a conciliação tem-se as seguintes diretrizes e princípios, conforme art. 51 da Instrução Normativa FEMARH Nº 11 DE 25/05/2022: I – informalidade e oralidade, mediante o uso de linguagem clara, que facilite a compreensão do autuado; II – imparcialidade, garantida pela presidência do Núcleo de Conciliação Ambiental; III – respeito à livre autonomia do autuado, que possui liberdade para manifestar sua vontade de conciliar; IV – economia processual e celeridade, à vista de seu objetivo de buscar o encerramento do processo em seu início, sempre que possível; e V – decisão informada, garantida pelo conteúdo obrigatório do termo de conciliação ambiental.
Dessa feita, o Decreto estadual em comento apenas manifesta-se, alinha-se de modo coerente com o que a legislação federal já definia. É indubitável que a conciliação se configura em um instrumento de muito valor e pode representar uma chance de se entabular um diálogo entre o autuado e o órgão ambiental, com vistas a viabilizar uma solução consensual que contemple os interesses do meio ambiente e da sociedade, de modo menos burocrático, mais célere e ameno.
“Alertamos o produtor rural, nossos heróis do campo, a procurarem seus técnicos de confiança e advogados especialistas na matéria para tirarem dúvidas”
Nesse viés, o que se tem agora é o dever da Administração Pública em estimular a conciliação com o fim de encerrar os processos administrativos decorrentes de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, sempre pautando tal conduta na busca do consenso, da harmonia das relações e na busca de um ambiente equilibrado, ecologicamente correto sem esquecer da necessidade de se ter a parte econômica também balizada nessa solução.
No Decreto n.º 1436/2022, após a citação do autuado quanto à existência do auto de Infração inicia-se o prazo de 20 (vinte) dias (úteis) para que o mesmo manifeste interesse em conciliar. O mencionado interesse na realização de conciliação deve ser formalmente protocolado na SEMA, por meio do sistema eletrônico SIGA, momento em que interrompe-se o prazo para apresentação de defesa administrativa até análise definitiva do Núcleo de Conciliação Ambiental da proposta apresentada pelo autuado.
Para ser aceita, a proposta de conciliação deverá estar acompanhada da definição das medidas corretivas a serem executadas, além dos respectivos prazos definidos em cronograma de execução e cumprir os requisitos devidos, algo muito assemelhado ao próprio Projeto de Recuperação de Área Degradada e Alterada – PRADA.
Dentre as inúmeras vantagens de um processo que passa pela conciliação, é importante salientar a possiblidade de ampliar o debate com a escuta das partes, pois, deve ser analisado as circunstâncias específicas de cada caso, ao passo de reparar o suposto dano ao meio ambiente e tratar cada caso com as respectivas peculiaridades.
Espera-se que se dê o devido cumprimento ao Decreto n.º 1436/2022, dando transparência para as decisões em matéria ambiental, dentro das regras vigentes, mas com novas estratégias e com o intuito de encontrar soluções alternativas não simplórias, mas balanceadas entre o produzir e preservar, dando dignidade a todos os envolvidos.
Alertamos o produtor rural, nossos heróis do campo, a procurarem seus técnicos de confiança e advogados especialistas na matéria para tirarem dúvidas, bem como verificarem, em sendo o caso, qual caminho deve ser tomado para a situação específica, ainda mais que o Decreto n.º 1436/2022 traz em seu artigo 77 que “nos processos administrativos pendentes de julgamento definitivo, os autuados poderão requerer a conciliação no prazo de até 30 (trinta) dias úteis, contados da data de publicação deste Decreto.”, tal prazo finda-se no mês neste mês de agosto, fiquem atentos quanto a isso!
Ana Lacerda é advogada do escritório Advocacia Lacerda e escreve exclusivamente nesta coluna às quartas-feiras. E-mail: analacerda@advocacialacerda.com. Site: www.advocacialacerda.com
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