Há muito falamos que a vida do produtor rural não é nada fácil, são muitas intempéries e riscos direcionado a essa “indústria” a céu aberto. Mesmo assim, o homem do campo segue sendo uma das figuras mais comprometidas com a transparência dos seus atos e com a regularidade de seus negócios. Além disso, carrega a obrigação de obedecer a uma das legislações mais rígidas do mundo em relação ao meio ambiente, com algumas restrições existentes somente no Brasil.
Coadunando com o elencado acima, o governo federal publicou recentemente o Decreto nº 11.014 de 29 de março de 2022, que aprova o regulamento do registro nacional de tratores e máquinas agrícolas – Renagro, nos termos do disposto no § 4º-A, do art. 115 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro.
O texto do Decreto nº 11.014/2022 é bastante enxuto, consta com apenas 05 (cinco) artigos, pois, o regulamento do registro nacional de tratores e máquinas agrícolas ficou especificado no anexo contido no Decreto, esse com 30 (trinta) artigos.
A gestão do Renagro é incumbência do Ministério Agricultura, Pecuária e Abastecimento e, após a edição do Decreto nº 11.014/2022, perpassado o período disposto no art. 3º, qual seja, dia 30 de setembro de 2022, passa a vigorar a obrigatoriedade de registro no Renagro para tratores e demais aparelhos automotores destinados a puxar ou a arrastar maquinaria agrícola ou executar trabalhos agrícolas, desde que o trator ou máquina agrícola transite em via pública, sendo facultativo no caso de não transitar.
Importante salientar ao amigo leitor que o Renagro é o documento público, válido em todo território nacional e que após o registro, não terá custo ao produtor rural. O registro será disponibilizado tanto em meio físico, quanto digital. No documento estarão contidas as informações básicas sobre o trator ou a máquina agrícola, relacionadas ao proprietário; contendo ainda o registro do trator ou da máquina agrícola: um aspecto importante no que se refere à proteção contra furtos e roubos. O sistema deixará claro quem é o proprietário daquele trator ou máquina agrícola, assim, quem quiser adquirir um desses bens deverá observar o registro dele no Renagro, para evitar comprar “gato” por “lebre”.
Para o registro de propriedade do bem móvel no Renagro (trator ou máquina agrícola), de forma inicial, exigem-se informações relacionadas aos proprietários. Sendo pessoa natural, a exigência é o nome completo, número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia, o endereço residencial, o número de telefone celular e o e-mail. Porém, sendo pessoa jurídica, as informações exigidas são o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ, a razão social, o nome fantasia, o endereço, telefone, e-mail e identificação do representante legal.
“O sistema deixará claro quem é o proprietário daquele trator ou máquina agrícola, assim, quem quiser adquirir um desses bens deverá observar o registro dele no Renagro, para evitar comprar “gato” por “lebre””
Importante asseverar que é de responsabilidade do fabricante, ou importador, pré-cadastrar as informações relativas aos bens por eles produzidos ou importados na base nacional de tratores e máquinas agrícolas.
Para realização do pré-cadastro do trator ou da máquina agrícola, o fabricante, o importador ou o agente autorizado, cadastrado no sistema Renagro, deverá inserir informações relativas ao modelo, local de produção, nome e registro profissional do responsável técnico, do código do chassi, ano de fabricação, das dimensões referentes à altura, à largura e ao comprimento, bem como dos itens obrigatórios para trânsito em via pública.
Como já exposto, o Renagro será obrigatório, nos casos de máquinas que transitem em vias públicas e produzidas após o ano de 2016, sendo facultativo quando não transitarem nessas vias. Contudo há a exceção de que Renagro seja facultativo para tratores ou máquinas agrícolas produzidas antes de 2016, mesmo que transitem em via pública.
Destaca-se que o Renagro não é um “salvo conduto” para que o proprietário possa transitar livremente em via pública com o trator e máquina agrícola, não é isso! Ele apenas cria o sistema de registro, mantendo incólumes as regras relacionadas ao trânsito em via pública, ou seja, devem ser observadas pelo proprietário as dimensões máximas permitidas e a instalação e o funcionamento dos itens obrigatórios de segurança, em conformidade com o disposto na Lei nº 9.503, de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro e nas resoluções do Conselho Nacional de Trânsito – Contran.
Sem sombra de dúvidas, ter um sistema que deixa claro quem é o proprietário de determinado bem em nível nacional é algo louvável, ultrapassa um tempo arcaico em que nos casos de roubos ou furtos dessas máquinas e/ou tratores, os órgãos de segurança pública e do Sistema Nacional de Trânsito não sabiam onde acessar para ter os dados do bem, ficando apenas com informações trazidas pelo proprietário. Antes da implementação dessa nova regulamentação, a propriedade de um maquinário agrícola era comprovada por meio de nota fiscal de compra, ou do registro em cartório, modo bastante oneroso e que acabava sendo uma exigência para a realização de seguro do bem.
Ou seja, não basta já ocupar uma posição de tantas adversidades, o proprietário de máquinas rurais tinha que arcar com mais essa despesa da comprovação de propriedade do seu maquinário, deixando pequenas fortunas nos cartórios nacionais.
Em conformidade com dados da Anfavea (Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores), o Brasil ganha 35 mil novos tratores e máquinas agrícolas por ano. Desse modo, os registros devidos são indispensáveis até mesmo para garantir um pouco mais de segurança aos donos de máquinas agrícolas. Outrossim, o atesto da propriedade do maquinário também consolidará operações de compra e venda desses veículos.
Merece destaque que uma das formas de identificação das máquinas será por intermédio da fixação de plaquetas ou etiquetas, constando o nome e endereço do fabricante, devendo ser alocadas no trator ou máquina agrícola, de modo que dificulte a adulteração ou remoção sem detecção, dificulte a mutilação das características originais da máquina, minimize o risco de danos durante a operação agrícola e seja legível à luz do dia. Outra exigência é que o condutor de tais máquinas seja habilitado no sistema nacional com carteira de categoria de no mínimo B, além de ter a obrigação de dar cumprimento às demais regras de trânsito, como uso de cinto de segurança, faróis operando integralmente, retrovisores corretamente utilizados etc.
No que concerne à transferência de propriedade, essa também se dará por intermédio do sistema do Renagro. É necessário que o dono do veículo já tenha cadastro no Renagro para realizar a troca de titularidade. O aceite do novo proprietário também deverá ser confirmado na conta do sistema, em até trinta dias desse prazo.
Embora haja o lado positivo da transparência e da segurança, não se pode deixar de ponderar ainda se este não seria mais um passo para acrescer a burocratização da vida rural e um direcionamento para que no futuro tenha-se mais contas a pagar, como abrir precedentes para a imposição do emplacamento, cobrança de IPVA, mais taxas e impostos de quem já, com muito suor, produz alimento, gera empregos e riquezas enormes para o Brasil.
Não se pode mais desamparar o produtor, ele merece nossa proteção – inclusive, pelo nosso próprio bem-estar e segurança alimentar!
Ana Lacerda é advogada do escritório Advocacia Lacerda e escreve exclusivamente nesta coluna às quartas-feiras. E-mail: analacerda@advocacialacerda.com. Site: www.advocacialacerda.com
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