Na semana passada, discutimos o tema da responsabilidade penal das pessoas jurídicas em crimes ambientais, e que devido a sua importância, e a impossibilidade de esgotar o tema em um único artigo, demandou uma necessária continuação, para que alguns desdobramentos sejam melhor observados, o que ora passamos a fazer.
Como mencionado anteriormente, a evolução jurisprudencial no Brasil, após o marco decisório do Supremo Tribunal Federal que permitiu a responsabilização penal autônoma das empresas, sem a exigência de condenação simultânea das pessoas físicas envolvidas, inaugurou novos desafios e incertezas, particularmente para o produtor rural, que se viu inserido em um emaranhado normativo de complexa interpretação.
“Assim, ante tantas nuances, ressaltamos que permanece a necessidade de um aprimoramento legislativo e jurisprudencial que permita a efetiva aplicação das sanções penais de maneira justa e eficaz”
Na sequência, importante detalhar que esse novo paradigma impõe desafios significativos, sendo o primeiro deles a forma de execução das sanções penais impostas às pessoas jurídicas, uma vez que a aplicação de penas privativas de liberdade é, evidentemente, inaplicável; o que leva à necessidade de sanções alternativas, como multa, restrição de direitos e prestação de serviços à comunidade. Essas sanções, previstas na Lei de Crimes Ambientais levantam questões sobre sua eficácia e adequação como instrumentos de repressão penal.
Mais adiante, a questão da prescrição também merece atenção especial, ao passo que o STJ, em diversas oportunidades, tem reafirmado que as regras de prescrição previstas no Código Penal se aplicam também aos crimes ambientais cometidos por pessoas jurídicas, exceto quando a pena imposta for exclusivamente a de multa. Fato problemático, pois as particularidades das pessoas jurídicas, como a continuidade de suas operações e a dispersão de suas responsabilidades, podem complicar a determinação do prazo prescricional e a execução da punição.
Merece destaque, a possibilidade de as pessoas jurídicas firmarem Acordo de Não Persecução Penal – ANPP com os órgãos correspondentes, desde que os crimes investigados sejam exclusivamente praticados contra o meio ambiente. Logo, para formalização do ANPP com pessoas jurídicas, deverão ser observadas as exigências cumulativas dos artigos 27 e 28 da Lei n.º 9605/98, bem como do art. 28 – A do Código de Processo Penal.
E ainda na esteira das controvérsias, tem-se a possibilidade ou não de transferência de responsabilidade penal em casos de incorporação de empresas. Para dirimir a questão, emerge o princípio da intranscendência da pena, consagrado no artigo 5º, inciso XLV, da Constituição, o qual impede que a responsabilidade penal de uma empresa seja transferida para outra em caso de fusão ou incorporação. Essa interpretação foi confirmada pelo STJ no julgamento do REsp 1.977.172, onde se decidiu que a responsabilidade penal não pode ser transferida junto com as obrigações patrimoniais da empresa incorporada protegendo o princípio de que a punição deve se restringir ao autor do ilícito, evitando a extensão indevida de sanções a entidades que não participaram diretamente do ato ilícito.
Assim, ante tantas nuances, ressaltamos que permanece a necessidade de um aprimoramento legislativo e jurisprudencial que permita a efetiva aplicação das sanções penais de maneira justa e eficaz, garantindo que as pessoas jurídicas respondam adequadamente por suas ações sem violar os princípios fundamentais do direito penal, uma vez que a ausência de clara regulamentação tem gerado uma atmosfera de insegurança jurídica que impacta diretamente o setor rural.