Contratos Rurais

Irajá Lacerda, é advogado, Presidente da Comissão de Direito Agrário da OAB/MT e Presidente da Câmara Setorial Temática de Regularização Fundiária da AL/MT.

O chamado setor primário da economia (que engloba atividades exploratórias de recursos da natureza, como a agricultura e a pecuária) possui grande peso na estrutura econômico-financeira brasileira. O País é, até os dias atuais, indubitavelmente agropecuarista, apesar de existir um inegável e consistente crescimento nos demais setores – no setor secundário, no qual se convertem as matérias primas obtidas no setor primário em bens industrializados; e no setor terciário, relacionado aos demais serviços (por exemplo, transporte, turismo, educação, etc.).

 

Assim, é essencial a regulamentação e positivação dessas atividades pelo Estado e pelo Direito, mediante a utilização de Contratos Rurais, fornecendo a devida segurança às relações jurídicas decorrentes da terra – que, ressalte-se, já eram jurídicas em sua essência, mas ainda não encontravam o necessário resguardo normativo para existirem e, portanto, eram realizadas com base na boa fé dos indivíduos contratantes.

 

Dentre as inúmeras obrigações que podem surgir de tais relações, duas chamam a atenção por sua utilização recorrente e merecem ser objeto de estudo mais aprofundado, quais sejam o arrendamento e a parceria rural, comuns desde que a agricultura e a pecuária se tornaram meio de obtenção de renda e deixaram de ser utilizadas para mera subsistência do ser humano.

 

Interessante mencionar que as figuras do Arrendamento e da Parceria Rural são práticas comuns à sociedade desde a era neolítica, ainda que de forma bem mais rudimentar do que atualmente, notando-se que a própria sobrevivência do homem e, posteriormente, o surgimento das sociedades, decorreram da exploração da agricultura e da pecuária para produção de alimentos, abandonando-se, pouco a pouco, atividades como a caça direta.

 

Mas a relação dos indivíduos com a terra não estacionou na subsistência: com o tempo, tomou características econômicas e fins de expansão de renda, gerando relações jurídicas não positivadas de propriedade e posse rural. Interessante mencionar que a existência de contratos rurais, especialmente de arrendamento, remonta à Roma Antiga, observe-se:

 

Com a expansão do império romano, todas as terras conquistadas passaram a pertencer ao Estado. O Estado romano, com a necessidade de fixar as pessoas nas terras para manter o domínio pleno, arrendava suas terras conquistadas a particulares, por meio do instituto do ius in agro vectigali, ou ager vectigalis – espécie de arrendamento perpétuo ou de longo prazo (cem ou mais anos), mediante o pagamento de cânon anual, oriundo do victigal, que genericamente, equivalia a tributo rural. Com a finalidade de solucionar o problema do plantio e do cultivo de imensas glebas (latifundia), os latifundiários também arrendaram suas propriedades, ampliando-se a forma da ocupação e do cultivo das terras particulares, nos moldes dos arrendamentos praticados pelo Estado romano. 

 

Essas relações, progressivamente mais complexas, como consequência da própria complexidade da sociedade e dos indivíduos, fazem jus a uma regulamentação própria e específica, partindo-se de noções contratuais básicas e genéricas e alcançando institutos como o Arrendamento e a Parceria Rural, que têm como finalidade conceder a mencionada segurança normativa às partes envolvidas sobre o negócio em questão.