Sobre as ações possessórias

Ana Lacerda é Advogada atuante nas áreas de Direito Agrário e Ambiental na Advocacia Lacerda. Membro da comissão de Direito Agrário e da comissão de Direito Ambiental da OAB/MT

Na semana passada trouxe aqui algumas reflexões sobre propriedade e posse. É importante compreender as principais diferenças entre os conceitos e como garanti-los sobre um determinado imóvel. Para tanto, é preciso conhecer um pouco mais sobre as ações possessórias.

As ações possessórias estão previstas no Novo Código de Processo Civil, nos artigos 554 a 568, e objetivam garantir a posse de um bem. O assunto é de grande relevância, tendo em vista seu envolvimento com questões sociais primárias de desenvolvimento e sustento.

A conceituação do termo “posse” denotou-se com o passar dos anos e o aprimoramento das organizações sociais, culturais e políticas. No decorrer do tempo, ganhou tamanha relevância, a ponto de admitir a intervenção judiciária na hipótese de ameaça a esse direito, e como instrumento de proteção à posse, têm-se as ações possessórias.

“Nos dias contemporâneos, experimenta-se uma efervescência de dinâmicas sociais e econômicas, ocorridas em concomitância com transformações de diversas ordens, entretanto, as demandas para uma sobrevivência digna são as mesmas de nossos antepassados e partem de garantias legais mínimas.”

Gama (2011, p. 167) expressa que “proteção judicial da posse é cabível nos casos em que, em decorrência de ato ilícito de ameaça, turbação ou esbulho, há clara possibilidade de perda ou obstrução do exercício do poder de fato sobre a coisa”.

Nos dias contemporâneos, experimenta-se uma efervescência de dinâmicas sociais e econômicas, ocorridas em concomitância com transformações de diversas ordens, entretanto, as demandas para uma sobrevivência digna são as mesmas de nossos antepassados e partem de garantias legais mínimas. Nesse sentido, é primordial que as normas jurídicas se aproximem e estejam intimamente integradas com a realidade concreta subjacente, e esse vislumbre cabe perfeitamente à noção de posse e as suas correlatas ações possessórias.

Em que pese não haver unicidade sobre os efeitos da posse na doutrina de maneira geral. No Brasil, os efeitos dela são muitos (de maneira ilustrativa): (i) direito aos interditos; (ii) direito aos frutos; (iii) direito à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias; (iv) direito ao levantamento das benfeitorias voluptuárias; (v) direito a usucapir o bem e (vi) direito à indenização pelos danos sofridos com a turbação ou esbulho.

Importante ressaltar que posse e propriedade não se sobrepõem hierarquicamente nesse contexto. Do mesmo modo, as ações possessórias compõem um rol de procedimentos especiais que se submetem a algumas normas muito específicas cujo intuito é assegurar a posse, independentemente de qual direito real tenha lhe dado causa.

Como exemplo, cita-se o artigo 558 do Código de Processo Civil, o qual orienta no sentido de que se proposta a ação possessória dentro do prazo de ano e dia da data da turbação ou esbulho, essa será regida pelo procedimento especial. Nesses casos, é considerada como posse de força nova, e admite a prestação jurisdicional em regime de urgência por meio da concessão da liminar sem que seja ouvida a parte contrária. Fato que representa grande benefício processual para o autor da demanda.

Passado o prazo indicado, a posse é chamada de força velha, e a ação será regida pelo procedimento comum, conforme parágrafo único do supracitado artigo.

A diferença de procedimento especial ou comum, fica restrita à possibilidade ou não de obter-se a medida liminar de manutenção ou reintegração de posse em favor do autor, pois, a partir da apresentação da “defesa” pelo réu/réus, a ação, seja de força nova ou de força velha, seguirá pelo procedimento comum.

Sobre essas perturbações que se pretende afastar, podem-se enumerar as ações possessórias como: ações de reintegração, de manutenção e o interdito proibitório. A primeira deve ser interposta quando houver esbulho à posse, em outras palavras, quando acontecer a perda total da posse, motivo que fundamenta a necessidade da reintegração. A segunda ação, de manutenção de posse, deve ser promovida quando acontecer turbação, um impedimento ao exercício pleno da posse pelo possuidor. E, por derradeiro, o interdito proibitório cabe quando ocorrer ameaça à posse, um risco iminente, seja de esbulho ou turbação.

“Lidar com as questões relativas a terra é manejar a paz social, a dignidade e o desenvolvimento humano”

Nessa linha de raciocínio, vale também destacar o princípio da fungibilidade das ações possessórias, expresso no artigo 554 do mesmo Diploma Legal que menciona: “A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados”.

Vale ressaltar que cabe ao magistrado competente dar ampla publicidade às ações desse tipo, informando dos prazos processuais usando até mesmo anúncios em jornais ou rádios locais, publicação de cartazes na região dos conflitos, tendo em vista que nem sempre as partes interessadas são facilmente contatáveis.

Outrossim, o autor de uma ação possessória pode cumular o pedido de uma ação possessória, em consonância com o que prevê o art. 555, com: I – condenação em perdas e danos; II – indenização dos frutos. Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada para: I – evitar nova turbação ou esbulho; II – cumprir-se a tutela provisória ou final.

A necessidade de proteger a posse é uma matéria de fundamental importância e de fácil observação no cotidiano. Lidar com as questões relativas a terra é manejar a paz social, a dignidade e o desenvolvimento humano.