Dez anos de Código Florestal

O documento legislativo mais impactante sobre o meio ambiente e na vida do produtor rural, o afamado Código Florestal Brasileiro, Lei Federal no. 12.651 de 25 de maio de 2012, completou 10 anos.

De forma inicial é importante fazer um questionamento: o produtor rural brasileiro tem motivos para comemorar essa data?

Sem adentrar ao mérito legislativo, ainda mais, se compararmos ao “retalho” que se tinha no código florestal anterior, cremos que a reposta é positiva, contudo, com muitas ressalvas.

A necessidade de um novo Código Florestal se deu pela inefetividade do Código anterior, bem como pela sua inadequabilidade ao contexto contemporâneo, ainda mais tendo em vista que o anterior era da década de 60, datado em 1.965 (Lei Federal no. 4.771/65), tempo muito diverso do que se tem atualmente, especialmente em relação aos avanços na produção agropecuária, na consciência e conhecimento a respeito dos fenômenos ambientais.

Não se pode deixar de mencionar que o Brasil responde hoje a uma das mais rígidas legislações ambientais do mundo, razão pela qual, diferente do que comumente se veicula por aí, temos também altíssima preservação. A verdade é que se a legislação não encampa os objetivos nela elencados, é muito mais por falta de vontade política, negligência estatal e interesses obscuros, jamais e em tempo algum, por desrespeito dos produtores rurais.

Oportuno é de se realçar que, além da própria norma infraconstitucional, objeto da presente análise, a vontade preservacionista vem desde o legislador originário, constituinte, conforme muito bem é relatado na Constituição Federal de 1.988, tendo sido apelidada pela comunidade internacional de Constituição Verde, considerando-a a mais avançada do mundo nesse tema.

O Código Florestal é resultado de muitos debates, audiências públicas e questionamentos jurídicos quanto à anistia, à reserva legal e às áreas de preservação permanente. Outrossim, a legislação florestal é produto de pensamentos e saberes que foram amadurecidos no decorrer dos anos e representa uma tradição jurídica nacional.

Na ocasião da aprovação do Código Florestal o Conselho Nacional de Urbanismo e Meio Ambiente (CONCAUMA), Coordenadores de Centros de Apoio (CAOMAs) dos Ministérios Públicos de mais de dezoito estados da federação se reuniram, no dia 18 de abril de 2012, na sede da Procuradoria-Geral da República para se manifestarem sobre essa norma tão impactante na vida dos cidadãos, tanto da cidade quanto do campo.

A atualização do Código Florestal é fruto legítimo da democracia parlamentar e foi amplamente discutida. Mesmo assim, foram ajuizadas algumas ações de inconstitucionalidade – ADI, rechaçando artigos basilares que concedem a imprescindível segurança jurídica ao produtor rural.

As ações foram julgadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em conjunto com a Ação Declaratória de Constitucionalidade –  ADC 42/2016, e receberam sentença de rejeição, uma vez que os artigos arguidos apresentam legitimidade institucional e democrática.

No julgamento das ações o Ministro Luiz Fux asseverou que o meio ambiente é direito e dever dos cidadãos, e ainda, o homem é parte indissociável do meio ambiente, vez que somos produto dele e dependemos de seus recursos para a sobrevivência. Ou seja, muito bem ponderou não haver espaço para maniqueísmo fanático a respeito da temática, até pela imprescindibilidade da mesma no futuro das gerações. Sem ambiente não há vida.

Continuou o Ministro expressando que “as políticas públicas ambientais devem conciliar-se com outros valores democraticamente eleitos pelos legisladores, como o mercado de trabalho, o desenvolvimento social, o atendimento às necessidades básicas de consumo dos cidadãos etc. Dessa forma, não é adequado desqualificar determinada regra legal como contrária ao comando constitucional de defesa do meio ambiente (art. 225, caput , CRFB), ou mesmo sob o genérico e subjetivo rótulo de “retrocesso ambiental”, ignorando as diversas nuances que permeiam o processo decisório do legislador, democraticamente investido da função de apaziguar interesses conflitantes por meio de regras gerais e objetivas.”.

A perseguição se deu, e ainda se dá, mas é mister sublinhar que dos cinquenta e oito dispositivos impugnados do novo Código Florestal, apenas alguns incisos do artigo 3º tiveram acolhimento de inconstitucionalidade.

É preciso destacar que o legislador derivado, ao formatar o Código Florestal, não visou “meramente” preservar florestas, mas a vegetação em qualquer de suas espécies e âmbitos, bem como as relações do homem com a terra, a fim de regulamentar a exploração e o desenvolvimento, para que os efeitos das ações não desestabilizem o local ecologicamente, mas também viabilize o trabalho, o sustento e o alimento da sociedade.

“São dez anos consolidando uma política que contribuiu para que o Brasil se transformasse numa potência ambiental e agropecuária”

A ideia é que não se elabore um emaranhado normativo que impeça o desenvolvimento de atividades essenciais para qualquer população, como a alimentação, a própria segurança alimentar, a geração de incontáveis empregos, a criação de renda e a composição de uma cadeia econômica estrutural para todos.

Não se nega que ter o meio ambiente saudável, ecologicamente preservado é de suma importância para a sociedade, contudo, deve-se aliar isso aos demais objetivos que também são tão importantes quanto, pois, não se terá sociedade equilibrada enquanto não se erradicar a pobreza, a marginalização, a redução das desigualdades sociais, a proteção da propriedade, o pleno emprego e a defesa do consumidor.

Vivemos em uma complexidade que deve ser visualizada como partes que se compõem, se ajustam, se adequam e são imprescindíveis, não apenas como indivíduo, pois, se assim não fosse, a balança penderia apenas para um lado, trazendo, como já exposto, um desequilíbrio que impactaria a vida de todos.

Dessa forma, o Código Florestal conseguiu fazer, com algumas ressalvas, que não haja duelo entre natureza e obra humana, as políticas públicas ambientais devem convergir para um centro comum à tutela do desenvolvimento, considerando um manejo racional do patrimônio ambiental e o cuidado para que as futuras gerações não sejam vítimas de escolhas trágicas, baseadas em conclusões rasas, por mais bem intencionadas que possam parecer.

O regramento em pauta trouxe vários instrumentos para uma melhor gestão das questões correlatas ao meio ambiente, à produção agropecuária e à preservação ambiental.

Um bom exemplo disso é o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA). Evidentemente, que são necessários ajustes e implementação de sistematização e celeridade, todavia, é inegável que a norma jurídica em análise foi e é de extrema relevância para o efetivo ganho da sociedade.

São dez anos consolidando uma política que contribuiu para que o Brasil se transformasse numa potência ambiental e agropecuária, que define como deve ser a ocupação e uso do solo nos imóveis rurais e estabelece regras claras para a conservação e a restauração de vegetação nativa em áreas públicas e privadas.